segunda-feira, 8 de abril de 2013


Os Deserdados na
 Pintura de Fabricius Nery

Por Jardel Dias Cavalcanti



     Revelar sentimentos e existências recôndidas através da forma plástica: eis o princípio de algumas das pinturas de Fabricius Nery. Os que estão mergulhados no anonimato absoluto, os deserdados da vida social, os abandonados à solidão total, os esquecidos para sempre e desde sempre.
    Habitantes de sua pintura, que retornam dignamente numa dimensão plástica comovente: são pessoas adormecidas e recolhidas num auto-abraço quase fetal, são existências que se contorcem num movimento particularmente dramático de solidão imposta, são corpos que parecem almejar ora saírem de si, ora o retorno ao vazio absoluto.

     Apesar da situação existencial retratada pelo artista ser uma espécie de nervo exposto, em alguns casos Nery aplica nesses personagens uma camada pictórica delicada, através dos quais seus traços indicam uma grande leveza, colocando-os num espaço de onde emergem quase como se estivessem sendo protegidos pelo artista. Percebe-se, sem sombra de dúvida, um respeito por estas vidas noctâmbulas, esquecidas e condenadas à solidão.

     Em outros casos, o fato pictural acompanha o drama do personagem. Se ele se contorce nesse drama, é a pincelada, a cor e o desenho que reforçam essa situação. Isso se traduz num movimento ansioso, angustiado, agitado, e, por vezes, trágico. Não só nos gestos, mas na escolha de cores que trazem esse poderoso efeito emocional para o espectador. Cores escuras podem ser molduras dolorosas para um corpo clarificado por azuis e brancos.
    Nery não faz um retrato realista de seus personagens das ruas, das sarjetas e dos bancos das praças. Suas vestes não denunciam uma miséria de classe e seus gestos não contêm o desespero de uma revolta social. O artista prefere imprimir na própria tecitura de uma pintura insinuante a presença incômoda e ao mesmo tempo dignificada destes seres. Se na vida real eles são relegados à margem do mundo, na pintura de Nery impõem-se imperativamente por sua presença dramática.
    Exibem a solidão, seu abandono e sua marginalidade através de um grito que se faz sentir não só pela boca dos personagens, mas nas entranhas da pintura como se fossem suas próprias entranhas.












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